quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Quem sou? Quem estou?

Muitas pessoas confundem o que é parte de sua natureza e o que não é. Por exemplo, sou loiro, sou canhoto, sou baixo, sou ansioso, sou teimoso e sou ciumento. Quais dessas características fazem de fato parte de minha essência, de minha identidade, e quais não?

Minha proposta é simples: tudo aquilo que não precisa de uma ação para ser definida, ou seja, que se define por si, é o que eu chamo de condição, e faz parte de nossa natureza, de nosso ser. Por exemplo: sou loiro, e ainda que eu esteja no escuro ou ainda que eu pinte o cabelo, continuarei sendo, por natureza, loiro. Sou canhoto, e ainda que eu não esteja usando as mãos ou que eu segure uma caneta com a mão direita, continuarei sendo, por natureza, canhoto. Sou baixo, e ainda que eu esteja falando com alguém pelo telefone ou que eu use um calçado com plataforma continuarei sendo, por natureza, baixo.

Em contrapartida, tudo que precisa de uma ação no ambiente ao redor para existir, ou que seja motivado pelo ambiente, é comportamental, é parte de nossa personalidade, e, portanto, não faz parte de nossa natureza; é uma construção mental que fazemos sobre nós mesmos e não faz parte de nosso ser, mas de nosso modo de ser. Por exemplo: sou ansioso, mas eu só sou ansioso se uma situação despertar essa sensação; quando estou dormindo, não o sou. Sou teimoso, mas eu só sou teimoso quando contrariado; quando estou assistindo televisão, não o sou. Sou ciumento, mas eu só sou ciumento quando vejo alguém conversando com minha namorada; quando estamos só os dois, não o sou.

Portanto, qualquer característica de nossa personalidade não faz parte de nosso ser, mas do nosso modo de ser, o qual não é fixo e eterno. Por isso gosto de dizer que o modo de ser designa nosso estar, aquelas características que, por mais que estejamos acostumados a portar, são passíveis de mudança (ainda que isso nem sempre seja fácil), e portanto indicam antes como estamos, e não como somos.

Infelizmente, a sociedade nos ensina a fazer algumas inversões, quando nos impõe padrões de condição, anulando todas as nossas diferenças intrínsecas, o que gera por tabela a ideia de que personalidade é o que de fato nos torna diferentes. Dessa forma, as condições passam a ser passíveis de melhorias (o que estimula o consumo, mas deixemos isso de lado), enquanto que os comportamentos, uma vez que encarados inconscientemente como inatos, ganham status de tolerância e aceitação.

É essa distorção que explica porque algumas pessoas não conseguem encarar uma crítica às suas atitudes como uma possibilidade de melhoria, mas a entendem como uma afronta pessoal. Elas de fato acham que seu comportamento é parte de sua essência, por isso a crítica ganha uma conotação completamente pessoal, passa a ser uma agressão a sua própria identidade (quando, de fato, não é). Isso também explica porque algumas pessoas se sentem no direito de emitir "opinião" sobre uma condição; no fundo elas encaram a condição como um comportamento sendo, portanto, passível de avaliação moral. Mas, nesses casos, a crítica passa sim a ser um ataque pessoal, porque é uma agressão à identidade daqueles que a portam.

Deviam ensinar essas coisas na escola, acho que seria um belo começo pra construção de um mundo melhor...